No Pará Prefeitura quer multar ciclistas e apreender bicicletas em Belém

Prefeitura quer multar ciclistas e apreender bicicletas em Belém (Foto: Agência Belém)

Talvez você não saiba, mas, desde o dia 2 de agosto, a Prefeitura de Belém aprovou o Sistema Cicloviário do Município de Belém (Siclobel), que, ao menos no discurso inicial, visa incentivar a utilização em maior escala de bicicletas na cidade. No entanto, a ação possui um forte tom punitivo, que pode terminar causando diversos transtornos, constrangimentos e multas aos ciclistas.

O Siclobel foi criado na semana passada, a partir da Lei 9.314 de 2 de agosto de 2017, e está disponível no Diário Oficial do Município. No artigo 18, que trata das punições aos ciclistas, são citadas algumas condenações, como: advertência oral ou escrita pelo órgão gestor municipal; multa, cujos valores serão àqueles estabelecidos pela Tabela de Infrações de Trânsito; e até mesmo a apreensão da bicicleta.

O artigo diz ainda que "a aplicação de penalidade será graduada segundo a natureza e a gravidade da infração e de suas consequências, no termos do regulamento a ser instituído pelo Poder Público Municipal".

Em junho deste ano, o mato alto no canteiro central da Almirante Barroso, ao lado da ciclovia, surpreendeu os ciclistas, já que a obra no trecho foi finalizada. Foto: Mauro Ângelo

É justamente aí que são enfatizadas as polêmicas em torno do sistema. Segundo a jornalista e ciclista Melissa Noguchi, havia um projeto anterior para a "Lei da Bicicleta", prevendo melhores condições para os ciclistas e melhor organização do sistema cicloviário. O primeiro projeto estava sendo construído juntamente com membros do grupo "Bicicletada Belém". A proposta, no entanto, foi refutada em junho de 2015 pela bancada aliada de Zenaldo. Na época, o vereador Fernando Carneiro (PSOL) acusou a Prefeitura de Belém de promover uma espécie de "jogatina política" para assumir a autoria da lei que regulamentaria as ciclovias e ciclofaixas na capital paraense.

Curiosamente, cerca de dois anos depois, uma outra proposta foi apresentada pela bancada aliada, com inúmeros problemas no projeto, de acordo com membros de movimentos de ciclistas em Belém. Ainda assim, a medida foi rapidamente aprovada na Câmara, sem, no entanto, atender de fato importantes reivindicação dos ciclistas.

Contrapartida

De acordo com David Ferreira, servidor estadual e membro dos movimentos Ciclomobilidade do Pará, Bicicletada Pará e Bike Anjo Belém, o Siclobel é contestado e quebra um acordo feito anteriormente com os vereadores que aprovaram as medidas para a construirem em conjunto com usuários de bicicletas.

Outro ponto questionado: a Prefeitura não cria boas condições para ciclistas trafegarem nas vias de Belém. "É uma atitude péssima da Prefeitura, porque ela devia incentivar a ciclomobilidade, a mobilidade urbana, criando mecanismos, situações e condições para os usuários de Belém - sejam eles do transporte público, do carro, da moto, do táxi ou de outro meio de locomoção - incentivá-los a usar a bicicleta como forma de substituição de um ou dois transportes quando roda pela cidade. A Prefeitura de Belém não faz isso".

"O poder público não tem a capacidade de entregar uma única ciclovia em boas condições na cidade. A ciclovia da Duque de Caxias, por exemplo, foi entregue já com o piso deteriorado. Então, se não é possível manter e ampliar a malha de maneira digna, também não há condições de cobrar dos usuários. A Prefeitura é omissa, não realiza ao menos campanhas efetivas de boa conduta para ciclistas, não dá nenhuma orientação", diz Murilo Rodrigues, membros de grupos de ciclistas da capital.

Murilo lembra que a ciclovia da avenida Almirante Barroso foi a primeira criada em Belém. "Ela foi bloqueada para a obra 'sem fim' do BRT e entregue de volta com falhas gravíssimas, sem condições seguras para os ciclistas", diz.

Polêmica deve continuar

Para muitas pessoas, como não há "curso" para condução de bicicletas, utilização de placas ou mesmo cadastros, punir ciclistas seria algo sem pertinência em Belém.

A conscientização deve vir também de condutores de automóveis. De acordo com o art. 201 do Código de Trânsito Brasileiro (CTB), os motoristas devem guardar a distância lateral de um metro e cinqüenta centímetros ao passar ou ultrapassar bicicleta, sob pena de infração média e multa. "Se isso fosse colocado em prática ou fiscalizado, o ciclista estaria resguardo", diz Murilo Rodrigues.

Já o artigo 105 do CTB afirma que para as bicicletas é necessário o uso da campainha, sinalização noturna dianteira, traseira, lateral e nos pedais, e espelho retrovisor do lado esquerdo. A medida é antiga, no entanto nunca se transformou de fato em prática por parte da maioria dos ciclistas, como é possível observar em qualquer rua da Região Metropolitana de Belém, a qualquer momento.

Além disso, o outro momento em que o CTB discute a circulação e punições para ciclistas é o artigo 255, quando afirma que "conduzir bicicleta em passeios onde não seja permitida a circulação desta, ou de forma agressiva" é considerada infração média, ocasionando como penalidade multa e remoção da bicicleta. No entanto, em meio a tantas vias sem ciclovias organizadas, não é difícil ver isto. Ainda assim, a prática poderá resultar em punição futuramente.

Em nota, a Prefeitura de Belém informou que a lei que cria o Sistema Cicloviário do Município foi sancionada, publicada e volta à responsabilidade da Superintendência Executiva de Mobilidade Urbana de Belém. A Semob passa, então, a estudar o conteúdo final da lei, que recebeu emendas de vereadores da Câmara Municipal, e tem prazo de 120 dias (portanto, até dezembro) para regulamentá-la, quando serão definidas as regras para seu pleno funcionamento. Até lá, diversos movimentos de ciclistas devem fazer ações para evitar ou, ao menos, modificar esta aplicação.

Via DOL


Comentários

Postagens mais visitadas deste blog

Com exaltação do imaginário caboclo, Caprichoso vence 52º Festival Folclórico de Parintins, no AM

MEC recolhe livro didático com conto que aborda incesto, tortura e morte

'A perseguição nunca acabou', diz autor de livro sobre caçada nazista a gays